Veja um grafo dos poemas de André Vaz de Campos Moreira Tourinho
Na Pauliceia, um coração há Em homenagem à Avenida sobretudo Paulista Sobe do túnel e então desço no ponto Como quem dos céus tem um encontro A neblina que aparecia, era outono Seus habitantes talvez não a merecem Grandeza que no concreto resplandece Mais uma vez, a Pólis retoma forma Para a jornada de quem só acorda Com sentimentalidades ao ouvido A criar a trilha sonora De meu próprio filme Andando certeiro, é preciso destino? Treinando o fechado olhar Enquanto de dentro riu-se Busco fazer minhas obrigações Tendo meu pensamento preso Que há muito já estava longe No tudo faria para nele vivê-lo Inspira a paisagem antinatural Formigueiro no húmus cinzeiro Semáforos e carros são curral Talvez ali insistia em caminhar Ao vapor atmosférico da metrópole Por algo em especial, magia havia A multidão incessante de ritmo prole Qualquer figura passante à vista Com infinitas histórias de mim dissolve Entre abrupto passa-trans-porte Um quadro heterogêneo e disforme compõe-se Do mendigo ao pobre, desconhecido a Van Gogh! Resistem às copas espelhadas arte em casarões Inesquecíveis domingos e fins de semana Em que os mil tipos de tribos urbanas Fundiam-se em desfile pela marginal Sem que fosse Natal, Réveillon ou Carnaval A sensação única de crer Por um segundo ao menos Estar no lugar certo e ser Onde tudo vai acontecendo Estranha façanha de se ter Por me ver naquele momento Havendo de partir, quebra-se a hipnose Como se cansados do brinquedo gasto, Eu dela e ela de mim, a garoar deixa-nos Sabendo do amanhã que me revolve Agora, um fim de tarde Início de noite quase De um casual dia chuvoso Perfeitamente paulistano Pesadelo com que sonho imaginando Ah, Avenida Paulista e seus rostos mil! Cheia de desamor e Consolação e brio Para minha sincera surpresa Das tantas veias da Pauliceia A um coração pulsante se leva Que prometeu aos passos meus Não tão cedo os apagaria Pelas raras madrugadas Quando se visse vazia. André Vaz de Campos Tourinho 22/06/20 - Salvador, BA
Quarentena de Outono Mal acabo de chegar à vintena Aniversariando em quarentena A adolescência aqui se encerra Heis de mim segunda década Porém, o mundo nosso exige mais Do que divagar sobre questões particulares minhas Acordamos das anestesias banais Nova doença fora precisa para curar velhas feridas Celebro a vida entre cercas Pois lá fora o algoz é invisível Na tosse, no toque De quem quer que seja Não há rosto, casta, cor, pátria ou rito Alvo todos, salvo ninguém, tampouco invicto Das coberturas da Graça e Vitória Às favelas do Retiro, deserto visto Em absoluto tudo, cena histórica Como se nada houvesse existido Um povo que despovoou sua terra Aos moldes dum êxodo domiciliar Até as praças de consumo decidiram cessar Tais quais as turbinas de sovinas, como será? Feito formigas na iminência da chuva Percebemo-nos pequenos numa luta Após séculos de avanço e progresso, o inimigo Nada mais nada menos é do que microscópico Raul Seixas, sim, ele, Falhara em profeta serdes O dia em que a Terra parou não chegara Soberano geoide plenamente translada Somente a humanidade, de corpo, E, quiçá, alma, curvou-se ao Todo Já o homem enquanto ser não desiste Por isso, não há de prever fim de fins Quantas pragas e estiadas vencemos Tal advento como alerta tomemo-nos Muito exalta-se nas estações demais O verão pela atmosfera tropical energética Praias, biquínis, bronze à pele e carnavais Pelas cores e flores a brotar, a primavera Mas sábio revelou-se o outono prudente Que, em tempos correntes, dos outros à frente Prepara a folhagem a invernos incertos Contudo, não desanimeis assim tão fácil Mesmo em final de enredos, há posfácio Com frescor esperançoso de menino Cajado bata que nada está perdido. André Vaz de Campos Tourinho 08/04/20 - Salvador - BA
Escrito após um passeio no Forte de Stº Antonio da Barra Dedico a querida Ana Carmen Costa Dias Gradação, anil a verde, a da Vinci É inimitável em suas paletas Ah! Não poderei ousar descrevê-la Entenderia se também a visse Saia para lá estresse Hoje tu não me tentas Esta paz, não mereces Frente à cena tão lenta A minh’alma purifico nos rochedos Feito cada lavadeira do Cortiço Se cá vim dividido, pleno me vejo A vista nublada, límpida O corpo antes pesadiço Com estes olhos, levita. 04/12/2020 | Salvador, BA
A busca pela rima perfeita Não uma entre as mesmas Mas inaudita em diferença Opulenta da forma etérea Tal qual mensagem carrega Poesia não é escrita É música imaginativa Que de somente palavras necessita Caso haja mente armada de sinfonia Desperta-nos movimento, ritmo Comove-nos sentimentos, melodia O fardo pela criação de algo digno À vista de partituras de risca canônica O árduo equilíbrio Entre o vômito silvestre E o cientificismo Técnico ao que escreve Tons receados de inexatidão Ou literalidades tomar-los-ão Angústia a qual jamais ocorreria A olhares movidos a antipoesia O impasse eterno De preciso ser verdadeiro Ou levar-se a retê-lo Em prol de um belo A inglória luta de vencer o efêmero Desmotivada quando em processo Até o momento em que se lendo A entrega completa pelos versos, Embora outrora fora posta à prova rigorosa, Há a composição de uma identidade própria Creio que o despertar alheio seja a glória Que, de curiosa forma, torna-se nossa. André Vaz de Campos Tourinho 12/02/20 - Salvador
Em chamas de perdição, Deflagrou-se o coração Nada mais destrutivo Que um amor posseiro Nos íntimos abismos Insuflando o anseio: Dele ter-se inteiro Cessando-lhe ruídos Até antes possuídos Pungência para que se mova Urgência, nesta hora, não noutra Montes, arfantes pulmões e coriza A cura em busca se aponta nociva Na neblina, uma clareza, um objetivo: "Vez começada essa jornada, prossigo" Daquela brevidade, permaneceria Algo pétreo com espontânea garantia Desejosos de viver como jovens Bem aqueles que eufóricos sofrem Ao auge da vida à frente Docemente provam da morte Adrenalina que os percorre Sonhos são asilo e pão Nascidos de um sentimento vivo Sobreviveriam, sim, para isso Serve a juventude: tomar riscos Inda ingressantes das faculdades mentais Mas, em aura, iguais, sairiam dali jamais Marcados pelas mãos em fogo Ao tocar o fundo um do outro Estrangeiros primeiros de si Terno elo que se mantém firme Passado que nos é inalterado Marquise para dias de chuva Por mais distantes e a mudar Gratos pelo dado pelo acaso Que sem pedir ou prometer Presente deixa na memória O olhar perdido ao entardecer Corpo que parado se mostra Em músculos e ossos tremer No velho ouvido voz ressoa: "Destes braços, asas irão voar" Nostálgica, cerrou a janela Pasma pelo descuido se levar Alucinada por impetuoso vento Que acalenta tão quão invade Com incidente arrebatamento Mal sabendo o que houve ali Viagem em demasia Para voltar num só dia. André Vaz de Campos Tourinho 24/08/20 - Salvador
Retirante de terras distantes Daqui fez cenário de epifanias Da prosa, um jardim de rosas Em espinho, vincos dilacerantes. Seus laços, deixados ao salto de planos Resistem à prova do tempo soberano Palavras cruas e certeiras Nunca em busca de certezas Contra rios, inimiga do óbvio A ela, rocha se torna pluma Capitu ucraniana (nascida), pernambucana (escolhida) De olhar enigmático, penetrador Transcendente narrador Em chamas a mente lança E magistralmente desnuda, À luz de penumbras, Cada sentimento que nos apossa. Fotografias entre preto e branco Como lavar-se de tamanho encanto... Um século de seu advento E como esplendorosa supernova Sua estrela mostra não ter hora. 2020 | Salvador, BA
Não! Por qual razão? De fato ser responsável por aquilo Que por desatino qualquer cativo Esboce o planetário pesar Que uma pobre flor na praça Haveria de ali carregar Por cada passante assediada Em plena luz do dia Em pleno Sol do meio-dia Talvez por essas leve sou Se a mim tudo fascina Já esfacela murcha a flor Vítima de sua beleza nociva Cessa sem dono ou nome Na terra da qual brotou, some Da luz que viu, pura cobiça Se menos majestosa fosse Perdida entre rosas e Adônis Estaria viva, mas quem a lembraria Em versos de aroma eterno? Breve mártir de memorável sina. 23/06/2020 | Salvador, BA
A Sede Infinitiva Fulminante, quando não pólvora Enraizante, que não um sorriso Gasta como todas as metáforas Instante em que me reviro Sem ver ou ter onde transpô-lo Este imenso adentro me ocluindo Mais que engasgo ou enjoo Ácida falha, a busca de curar isto Como quem aponta a ponta Da flecha curva ao próprio íntimo E, ainda assim, beirar certo alívio. 05/06/2021 - Salvador, BA